Texto produzido por Cláudio Melon - Professor de História do Ensino Básico
Hoje é um daqueles dias históricos. Não só pela importância de significado, mas também pelo momento em que estamos vivendo. O 1º de Maio de 2020 vai ficar marcado como sendo o mais violento, em anos, para a classe trabalhadora. Estamos enfrentando uma pandemia entrelaçada com uma crise econômica de magnitude gigantesca. Mas não quero passar aqui falando apenas de mais e mais pandemia, isso a gente está cansado de ver na televisão.
Escrevo essas linhas para trocar uma ideia contigo que, assim como eu, vive do próprio trabalho. Quero te apresentar a nossa história. A história da classe trabalhadora do mundo. Bem provável que não verá esta história em nenhum grande jornal, em nenhuma emissora e muito menos através dos nossos governantes. Por isso, acho fundamental tratarmos de trabalhador para trabalhador, pois um com o outro, diretamente, podemos aprender e fazer o motor da história girar.
A história do 1º de Maio começa em 1886. Na cidade de Chicago, nos Estados Unidos da América. Naquele tempo, esse país que hoje é o centro do sistema econômico, vivia um desenvolvimento frenético energizado por sua Revolução Industrial. Ao mesmo tempo em que os grandes empresários acumulavam fortunas, os trabalhadores viviam em condições aviltantes. Condições que tornavam tudo um verdadeiro pandemônio. Jornadas de trabalho de 16 horas/dia, salários baixos, fábricas sem janelas, sem nenhum tipo de equipamento de proteção individual e muitas colegas tendo que trabalhar inclusive doentes ou em estágios avançados ou complicados de gravidez, para ter o que comer na noite daquele mesmo dia.
De tão desgastantes que eram os seus dias, perceberam uma coisa essencial que nos vale a lição. Entenderam que o único caminho possível da superação das suas dificuldades era a ação coletiva. Então, decidiram organizar um protesto, também conhecido como greve. Foram às ruas e reivindicaram melhores condições de trabalho para conseguirem viver minimamente. E o resultado não foi diferente destes que a gente vê na televisão quando resolvemos protestar e buscar nosso valor. Tiro, porrada e bomba, além de prisões e mortes.
Após esse dia de luta que aconteceu em Chicago, todo 1º de Maio passou a ser lembrado pelos trabalhadores do mundo todo. Os trabalhadores organizados em várias partes do mundo decidiram, sempre nesta data, parar as atividades. Não só como uma forma de luto em homenagem àqueles que morreram, mas também para lembrar a sociedade e os seus patrões de que: quem produz a riqueza, somos nós, os trabalhadores.
Precisamos lembrar que as máquinas e as ferramentas não funcionam sozinhas. Nossa energia humana é fundamental para a roda deste grande sistema funcionar. Pararam para pensar o porque de sermos perigosos, quando nos organizamos? Pois a roda pode parar. Por isso nos intitulam dos mais baixos adjetivos.
Acredito que ficou mais evidente isso nesta época de pandemia. Muitos funcionários são pressionados pelos seus patrões a trabalharem em condições calamitosas, correndo verdadeiros riscos de morte, pois obviamente dependem do nosso trabalho para sustentar as suas riquezas, as quais não ficam com a gente.
Aqui no Brasil não foi diferente. Nós fizemos uma primeira grande Greve Geral em 1917. Foram mobilizados mais de 50.000 trabalhadores no eixo Rio-São Paulo. Qual a reivindicação? Melhores condições de salário. Estávamos vivendo a Primeira Guerra Mundial e os nossos colegas daquele tempo viviam jornadas semelhantes às dos trabalhadores de Chicago. A ação não trouxe uma consequência imediata, pois colocaram, tão logo começou a greve, a polícia e os patrões para latirem em cima deles. Mas mandaram um recado para o Estado Brasileiro.
Essas lutas passaram a ser mais constantes. As organizações logo surgiram. Os sindicatos, tão essenciais na organização da nossa classe, passaram a ter papéis fundamentais para pressionarem os donos do poder a nos reconhecer na Constituição.
Enfim, finalmente as leis trabalhistas, uma a uma, foram aparecendo. Um presidente da república brasileira, de forma sagaz entendeu a importância dos trabalhadores urbanos organizados e decidiu tentar incluí-los de forma sistemática na legislação do nosso país.Mas, principalmente, por estar com medo da nossa organização autônoma. Obviamente que essa legislação foi fruto da incansável luta dos nossos camaradas do passado que pressionaram Getúlio Vargas. Assim, surgiu a Consolidação das Leis do Trabalho em 1943. Um direito. Uma conquista. Um objetivo alcançado, mas não cristalizado, através de inúmeras lutas e greves.
Desde então, muitos presidentes tentaram cooptar nossa classe. Desde Getúlio Vargas até os mais atuais. Tentaram transformar nosso dia em um dia despolitizado. Com festas, comemorações e falas apenas daqueles que não sofrem na pele aquilo que passamos diariamente.
Aliás, muitos destes políticos, dizem ser nossos amigos e protetores. Mas nunca fomos chamados para comer nos banquetes que são servidos aos banqueiros. Há 35 anos estamos passando por um processo chamado capitalismo neoliberal. E neste tempo todo, o que estamos assistindo sob o disfarce de “modernização” é ataque a nossa classe e aos nossos direitos. Dia após dia. Semana após semana. Reformas atrás de reformas.
Os servidores públicos municipais são parte de um dos grupos mais afetados com esse programa econômico. Além de ter sido estancado qualquer possibilidade de aumento salarial por conta do enxugamento de gastos, eles ainda são alvos da privatização sistemática que acontece governo após governo. Acabam esquecendo que quem está na ponta de lança do Estado Brasileiro são os servidores. Eles que vacinam, dão aulas, constroem ruas, erguem postes e cuidam da gente em tempos de covid-19. Que lidam no dia a dia com toda a população que também sofre as mazelas do nosso tempo. O que se percebe é que vão acabar transformando os servidores públicos em servos públicos.
Por fim, antes de fecharmos esses escritos, queria trazer aqui uma reflexão, já tão escassa nestes tempos, mas tão fundamental para agora. Será que é possível construir uma sociedade sem o nosso trabalho? Quando será que conseguiremos ser melhor retribuídos daquilo que produzimos? Quando ficaremos com essa riqueza?
Não são perguntas fáceis de serem respondidas. Se pensarmos na transformação a partir da ação individual, a gente vai ficar angustiado e descrente, pois sabemos que as instituições são mais fortes que qualquer um de nós sozinho. Por isso, é fundamental a nossa união. Nós trabalhadores temos situações semelhantes. Alguns mais, outros menos, mas a essência é que não temos dinheiro nos grandes negócios, então o que nos resta é a solidariedade e a luta política para construirmos o mundo com os pilares fundados no trabalho e não no lucro, na ganância e na exploração.
Espero que todos possam ter uma vida melhor daqui pra frente, embora todas as forças nos empurrem para a piora. Mas saiba que muitos iguais a vocês estão na mesma situação, e, por isso, a nossa organização é fundamental.